As principais vantagens de um biosensor vs técnicas convencionais de monitorização ambiental consistem na possibilidade de análise de múltiplos poluentes, miniaturização, e a importante possibilidade de utilização em campo num regime de tempo real. Marta Santos | ||
Resultante da crescente consciencialização dos efeitos do aquecimento global, da bioconcentração e da bioacumulação de poluentes, nos últimos anos têm sido adoptadas inúmeras acções e desenvolvidas novas leis que visam o controlo ambiental da poluição. De realçar a nível internacional os esforços da “The Stockholm Convention on Persistent Organic Pollutants”, que se propõe reduzir os níveis de poluentes orgânicos persistentes, e da “European Union Water Framework Directive” que irá revolucionar o modo de monitorização da qualidade da água. A nível nacional, destaca-se um dos objectivos do Plano Tecnológico que consiste na promoção da investigação na área da biotecnologia ambiental, visando o estudo de novas energias renováveis não poluentes, desenvolvimento de sistemas de monitorização, etc.. Todas estas iniciativas enfatizam o controlo de qualidade da água devido à importância deste recurso natural, bem como devido ao sobejamente conhecido fenómeno de dispersão de poluentes através do ciclo da água. Actualmente, a monitorização da qualidade da água, do solo, do ar, dos efluentes industrias e domésticos, etc., baseia-se na recolha de amostras aleatórias seguida de extracções e análises laboratoriais instrumentais. No entanto, estes procedimentos são limitativos fornecendo somente informação relativa a uma amostragem específica e sendo desprovidos de informação de variações espacio-temporais. Desta forma torna-se fundamental o desenvolvimento de sistemas de monitorização ambiental inovadores, baseados em tecnologias de ponta que permitam análise em tempo real. | ||
| ||
O processo de desenvolvimento de sistemas de monitorização ambiental contempla três níveis: i) Caracterização de ferramentas de triagem de poluentes altamente sensíveis, específicas e rápidas, que possam ser facilmente adaptadas para uso em campo (biomarcadores e imunoensaios); ii) Adaptação de tecnologias analíticas de ponta que permitam a identificação e/ou quantificação inequívocas e exactas de uma extensa gama de poluentes (cromatografia gasosa, cromatografia líquida de alta precisão, espectroscopia de massa, detecção por ultravioleta ou fluorescência, etc.); iii) Desenvolvimento de aparelhos com tecnologia integrada, combinando sensibilidade, flexibilidade e precisão das técnicas acima mencionadas. Curiosamente, os dois primeiros níveis do processo de desenvolvimento de sistemas de monitorização ambiental encontram-se avançados, tornando a integração da tecnologia actualmente disponível o principal objectivo de muitos centros de investigação. A nanotecnologia, tecnologia que envolve um grupo de técnicas emergentes na área da física, química, biologia, engenharia e microelectrónica, é capaz de manipular matéria na escala de 0,000000001 unidades de medida (nano) e tem contribuído de uma forma significativa para o desenvolvimento de aparelhos integrados para uma monitorização ambiental efectiva. De entre as diversas ferramentas analíticas desenvolvidas nos últimos anos, os biosensores apresentam-se como uma das tecnologias integradas mais promissoras. Segundo a IUPAC (International Union of Pure and Applied Chemistry), um biosensor define-se como um instrumento adequado à detecção de compostos químicos utilizando sinais eléctricos, térmicos ou ópticos gerados através de reacções bioquímicas específicas mediadas por enzimas, tecidos, ou células inteiras. Por outras palavras, um biosensor é capaz de efectuar análise quantitativa ou semi-quantitativa específica integrando um elemento de reconhecimento biológico com um elemento apropriado de transdução de sinal (Figura 1). | ||
| ||
Figura 1: Componentes essenciais de um biosensor. O transdutor de sinal encontra-se em contacto com o elemento de reconhecimento biológico que interage especificamente com o poluente existente na amostra. Alterações físico-químicas ou bioquímicas resultantes dessa interacção são amplificadas e convertidas em sinais eléctricos processáveis e quantificáveis.[ampliar] De acordo com a natureza do elemento de reconhecimento biológico podem-se dividir os biosensores em dois grandes grupos: i) Biosensores de afinidade; ii) Biosensores catalíticos. Nos primeiros, o elemento de reconhecimento biológico interage com o elemento em análise de uma forma estequiométrica, ou seja, a ligação entre ambos segue uma cinética particular e previamente conhecida. Nestes biosensores, os elementos de reconhecimento biológico podem ser ácido desoxirribonucleico (ADN), anticorpos, receptores proteicos, células, tecidos, etc. (Figura 2). De salientar que a principal vantagem dos biosensores de afinidade é a possibilidade de análise múltipla. O número de moléculas analisadas por um biosensor de afinidade é superior devido à vasta gama de especificidades facilmente obtidas aquando do uso de ditas unidades de reconhecimento biológico (por exemplo, anticorpos usados para desenvolver imunosensores). Por outro lado, nos biosensores catalíticos a interacção entre o elemento de reconhecimento biológico com o elemento em análise resulta na conversão de um substrato, inicialmente não detectado, num produto mensurável por meios ópticos ou electroquímicos. Estes elementos de reconhecimento biológico são principalmente enzimas ou microorganismos (bactérias ou leveduras) alterados geneticamente (Figura 2). A natureza catalítica destes biosensores permite detectar substratos, produtos, inibidores ou modeladores da reacção. Quanto ao elemento de transdução de sinal, são vastas as propriedades físicas que podem ser exploradas, no entanto as propriedades electroquímicas, ópticas e acústicas têm sido mais usadas (Figura 2). | ||
| ||
Figura 2: Exemplos de princípios explorados para o desenvolvimento de biosensores de aplicação ambiental.[ampliar] De uma forma geral, os poluentes são classificados em compostos orgânicos ou inorgânicos de acordo com a sua estrutura química. No entanto, os poluentes podem ainda ser classificados de acordo com o seu modo de acção uma vez alojados no organismo: i) Disrruptores endócrinos - induzem alterações hormonais; ii) Citotóxicos - efeito nocivo na célula; iii) Carcinogénicos - induzem cancro; iv) Mutagénese - induzem mutações no ADN; v) Genotóxicos - danificam o ADN. | ||
Devido à sua toxicidade, ubiquidade e persistência, os pesticidas são os poluentes orgânicos cujas concentrações permitidas no ambiente se encontram extensivamente legisladas. São vários os biosensores desenvolvidos para a detecção destes compostos, a grande parte baseada na inibição de enzimas específicas na presença do pesticida (por exemplo, acetilcolinesterases). Apesar da sua produção ter sido banida em vários países, os poluentes orgânicos bifenil policlorados (PCBs) persistem no meio ambiente. No entanto encontram-se desenvolvidos imunosensores e sensores de ADN úteis para a sua monitorização. As dioxinas, subprodutos policlorados libertados como resultado de inúmeros processos químicos que envolvam cloro, são considerados carcinogénicos e uma ameaça para a saúde pública. Biosensores que recorrem a células hepáticas como elemento de reconhecimento biológico permitem determinar a sua presença. Entre outros poluentes orgânicos encontram-se os compostos fenólicos, cuja capacidade de bioacumulação no ambiente é extraordinária; os surfactantes usados nos detergentes, que permitem a permeabilização a outros poluentes em animais aquáticos; os compostos aromáticos derivados de produtos petrolíferos que comprometem a potabilidade da água; e os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos derivados da combustão incompleta de combustíveis ricos em carbono (madeira, carvão, diesel, gordura ou tabaco). Para estes poluentes são vários os biosensores desenvolvidos (enzimáticos, imunosensores, recorrendo a bactérias alteradas geneticamente, etc) que permitem a sua monitorização; Substâncias médicas libertadas para o meio ambiente têm merecido menor atenção por parte de investigadores e legisladores. No entanto, a presença de antibióticos no meio ambiente contribui para o aumento da tão preocupante multiresistência a antibióticos. Para esta questão estão a ser aplicados imunosensores ópticos. Quanto a poluentes inorgânicos, o fosfato inorgânico e os nitratos (principais componentes de adubos) são responsáveis pelo fenómeno de eutrofização das águas, que por sua vez origina redução de biodiversidade de um ecossistema. Biosensores enzimáticos permitem a quantificação de fosfato inorgânico, e biosensores com bactérias alteradas geneticamente permitem determinar nitratos. De realçar ainda os metais pesados (chumbo, mercúrio, etc). Estes compostos de ausente função nos organismos levam a bioacumulação e bioconcentração podendo originar doenças severas. Estes metais podem ser monitorizados recorrendo a biosensores que utilizam enzimas, células e bactérias alteradas geneticamente. Em conclusão, como ferramentas de monitorização de qualidade ambiental os biosensores permitem quer a determinação de elementos de qualidade biológica/ecológica, quer a monitorização de compostos orgânicos e inorgânicos poluentes. As principais vantagens de um biosensor versus técnicas analíticas convencionais de monitorização ambiental consistem na possibilidade de análise de múltiplos poluentes em amostras complexas, miniaturização com consequente redução de custos de produção e de análise e a importante possibilidade de utilização em campo num regime de tempo real. Desta forma um biosensor pode ser usado para monitorização contínua de determinada área contaminada permitindo ainda analiticamente, não só a detecção específica de um químico, mas também a determinação do seu efeito biológico e biodisponibilidade. Desta forma, e apesar da lacuna em biosensores para um grupo significativo de poluentes, o desenvolvimento de biosensores para monitorização ambiental promete revolucionar os protocolos de controlo de qualidade vigentes. | ||
BIBLIOGRAFIA: Allan IJ, Vrana B, Greenwood R, Mills GA, Roig B e Gonzalez C. (2006). “A 'toolbox' for chemical and biological monitoring requirements for the European Union’s Water Framework Directive” Talanta 69:302-322. Rasooly A. (2005). “Biosensor technologies”. Methods 37: 1-3. Marco MP, Barceló D. (1996). “Environmental applications of analytical biosensors”. Meas.Sci.Technol. 7: 1547-1562. Rodriguez-Mozaz S, Lopez de Alda MJ, Barcelo D. (2006). “Biosensors as useful tools for environmental analysis and monitoring.” Anal Bioanal Chem. 386:1025-1041. Rogers KR, Gerlach CL. (1996). “Environmental Biosensors: A Status Report” in Environmental Science and Technology published by the American Chemical Society. Site consultado: www.pops.int |
sexta-feira, 13 de julho de 2007
Nanotecnologias – Biosensores e Monitorização Ambiental
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário